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quarta-feira, 22 de junho de 2016

Oscar Wilde 
O Retrato de Dorian Gray
["Porque influenciar uma pessoa é dar a ela a própria alma. Ela passa a não pensar com os pensamentos naturais. As virtudes que possui deixam de ser; para elas, reais. Os pecados que comete, se é que existem pecados, são todos tomados por empréstimo. Ela se torna eco da música de outrem, ator um de papel não escrito para ela."- O Retrato de Dorian Gray]

Este é o terceiro livro de Oscar Wilde a ganhar uma versão cinematográfica pelo diretor Oliver Parker juntamente com "Marido Ideal" e "Armadilhas do Coração".
O filme teve a ultima exibição na mostra Panorama do Cinema Mundial, no Festival do Rio 2010.

Eu não concordo que todas as adaptações sejam válidas. O livro é muito superior ao filme.O longa acaba por desrespeitar à memória do lendário escritor.
A atuação do protagonista Ben Barnes, deixou a desejar (Para quem assistiu as Crônicas de Nárnia pôde comprovar sua brilhante atuação interpretando o Príncipe Caspian). O livro é sofisticado com leitura fascinante, linguagem antiga e formal e faz aversão do jovem Dorian deixando o leitor deslumbrado com a narrativa, riquíssimo estilo clássico de Oscar Wilde.
Bom, o filme de forma independente não é tão ruim, mas vendo como adaptação não surpreende. Embora emplacou a interpretação de Ben, ainda conseguiu transmitir um ser frio, nocivo e perturbado, criando um ar de loucura oculta.

O livro critica a sociedade de sua época no que ela tem de pior, todos os seus defeitos e hipocrisias. Acredito também que Oscar utilizou seus personagens, especialmente Lord Henry, para passar várias das suas visões, teorias e pensamentos sobre a vida, o casamento, a moral e a beleza (entre outras), teses e questionamentos esses que não cabiam na sociedade da época e que dificilmente seriam muito bem aceitos.
O clima entre Lord Henry, Dorian Gray e Basil -os três principais personagens é claramente sensual, dualidade na expressão. As mulheres expressaram seus romances rasos, falando sobre realidade e vaidade, onde juventude, beleza e status são valores maiores. 

Dorian Gray é jovem, dono de uma beleza que encanta a todos, sejam eles, mulheres ou homens. Basil é um grande pintor que conhece Dorian e fica enfeitiçado pela sua beleza querendo eternizar tamanha beleza, ele pinta o retrato de Dorian Gray chegando a ficar completamente apaixonado por ele.

Lord Henry é o burguês amigo de Basil, que depois de alguns minutos com Dorian deixa-o completamente perturbado, colocando em sua cabeça questões nunca imaginadas pelo rapaz como o fim da vida e a degradação dos seus bens mais preciosos (beleza e juventude) devido à atuação do tempo. Induzido pelo amigo Lord Henry a se aventurar  em um universo problemático, pouco a pouco Dorian se torna mal, mesquinho, arrogante e corrompido.

Quando a pintura fica pronta, Dorian enfim, tomou consciência da sua beleza e foi completamente tomado pelo orgulho e pela vaidade então num ato de desespero ele pede para que nunca envelheça, faz um "pacto" as marcas do pecado que cometesse, dali em diante fosse transferida para o quadro e que ele ficasse eternamente jovem e belo. Assim, foi feito e Dorian passa a desfrutar de todos os prazeres oferecidos caindo em um abismo profundo de experiências desastrosas, relações insanas, orgias, assassinatos... O retrato de Dorian apodrece, exatamente como sua alma, enquanto ele se torna mais sensual e desejado fisicamente, justamente pelo seu descaramento.


impelido a implorar que o retrato suportasse o peso de seus dias para queele pudesse conservar o esplendor imaculado da eterna juventude! Todasas suas infelicidades daí provinham. Melhor seria se cada pecado cometido
trouxesse consigo sua punição rápida e segura.”
(página 266)

Era necessário, Sir, para o desenvolvimento dramático dessa história,cercar Dorian Gray com uma atmosfera de corrupção moral. De outra forma,a história não teria sentido e o enredo ficaria sem desfecho. Manter essa
A história de Dorian Gray é angustiante e intrigante. Comparar sua pureza do inicio ao trágico ser que se tornou... Dorian chega a ter nojo de si mesmo, do que observa no retrato. Todavia, em alguns momentos contempla o retrato com orgulho, como um prêmio, encantando com sua própria perversidade, como se contente por deter um segredo tenebroso só seu.

"Na verdade, o homem não busca nem o prazer nem a dor, mas sim apenas a vida. O homem procura viver intensamente, completamente, perfeitamente. Quando conseguir fazer isto, sem lesar a liberdade alheia e sem nunca ser lesado, quando todas as suas atividades só lhe proporcionarem satisfação, ele será mais saudável, mais normal, mais civilizado, mais si mesmo. A felicidade é a medida pela qual o homem julga a natureza e avalia até que ponto está em harmonia consigo mesmo e com o ambiente".  (Aforismos, Oscar Wilde)

A ideia de Oscar é provocar um intenso debate social sobre o papel da aparência X moral. O filme se apegou mais para o lado místico da obra em vez de privilegiar a crítica de Oscar em relação a sociedade vitoriana, aparentemente sorridente mas vazia e podre por dentro em uma época cheia de glamour, luxo, vaidades e aparências. Até que ponto uma pessoa pode influenciar outra? Qual o preço para ser jovial e belo? Qual o verdadeiro sentido da vida?

No que se refere às características físicas e psicológicas dos personagens principais não vemos muita diferença nos dias de hoje: vida dupla, mantendo uma aparência alegre, uma aparência virtuosa, enquanto se entrega as vaidades e ao orgulho numa vida completamente vazia. 


"Há duas tragédias na vida: Uma a de não satisfazermos os nossos desejos. E a outra de os satisfazermos". (Oscar Wilde) A frase define a vida de Dorian de tantos desejos (pecados) que ele cometeu sua vida pessoal e social acabou se transformando numa tragédia que ele mesmo fala:


"Ah! Que momento maldito aquele que o orgulho e a paixão o tinham impelido de implorar que o retrato suportasse  o peso de seus dias para que ele lhe conservasse o esplendor imaculado da eterna juventude! Todas as suas infelicidades daí provinham. Melhor seria que cada pecado cometido trouxesse consigo uma punição rápida e segura." (p. 266).
Embora o livro tenha sido escrito no final do século XIX, seu tema pode ser transportado para os dias de hoje, pois o ser humano sempre se sente incompleto, o romance de Oscar Wilde é sofisticado porém, bruto- Impelindo o eterno desejo do homem pela juventude, pela popularidade, pelas conquistas, pelo status de sua vaidade, dos perigos de brincar com as leis da vida.


A personificação da vaidade, orgulho e individualismo de Dorian, amante de si mesmo e capaz de cometer todos os pecados, mostra a nossa fragilidade e nos faz reconhecer a natureza humana que por vezes procuramos esconder não só da sociedade mas de nós mesmo.  Dorian ao se arrepender descobre que para sua maneira leviana de encarar a vida, não há redenção.

Na verdade a sociedade está banhada de hipocrisia!
Como nos comportaríamos se descobríssemos que
somos eternos? 
E que o tempo paralisaria exatamente aqui e nos conservássemos para sempre exatamente como somos?

Como seria o retrato da sua alma?
Flávia Couto Basso.

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